São Paulo – O Brasil e os Estados Unidos começam a atuar fortemente para ampliar a cooperação em sustentabilidade aplicada à cadeia de suprimentos. Os objetivos são elevar a competitividade dos produtos e serviços e intensificar os negócios entre os dois países, além de prestar contribuições relevantes para superar desafios globais ligados a aspectos econômicos, ambientais e sociais.
Um importante passo nesse sentido foi dado quarta-feira (6), na Amcham-São Paulo, em workshop promovido pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e o Departamento de Comércio americano. Empresas brasileiras e americanas fizeram exposições sobre suas melhores práticas.
A iniciativa faz parte do memorando de Diálogo Comercial, assinado em 2006 entre os dois governos, que estimula fundamentalmente a facilitação de comércio, entre outras questões de interesse mútuo.
“Foram previstas diversas áreas para cooperação, entre elas a inovação e as tecnologias verdes. A sustentabilidade é uma forma de incorporar essas duas prioridades, gerar mais oportunidades, aumentar a competitividade e o fluxo de comércio entre os dois países. Avançar em competitividade é importante para ambas as nações”, ressaltou Maria Cameron, diretora para o Brasil do Departamento de Comércio. O Diálogo Comercial também visa, segundo ela, maior interação em biocombustíveis, propriedade intelectual, padronizações, franchising, engenharia e arquitetura.
“Buscamos promover as melhores práticas para assuntos que impulsionam o comércio, como a inovação e, dentro dela, a sustentabilidade. A partir desse workshop, com a participação de um grupo seleto de representantes do setor privado, os governos partirão para um futuro plano de ação”, disse Marcos Vinicius de Souza, diretor de Fomento à Inovação da Secretaria da Inovação, implementada pelo MDIC em fevereiro deste ano.
Além do workshop, uma delegação formada por representantes do governo americano fará visitas técnicas para conhecer de perto os modelos sustentáveis adotados por natura, Pão de Açúcar e Walmart no Brasil.
Caminhos
Edson Carillo, CEO da Global Connexxion, consultoria especializada em engenharia da cadeia de abastecimento, destacou algumas tendências para alavancar a sustentabilidade:
Devem-se avaliar de forma sistemática as alternativas de suprimentos mais vantajosas, priorizando as locais e regionais e, assim, otimizar o uso dos modais de transportes. Atualmente, há ferramentas e modelos que auxiliam nesses processos.
As empresas estão investindo em pesquisas para redesenhar as embalagens, reduzindo gastos com materiais, estocagem e transporte.
Na armazenagem, é possível privilegiar a luz direta, instalar sensores de presença para ativar a iluminação e colocar lâmpadas de baixo consumo de energia. Os depósitos modernos usam roletes livres, que movimentam cargas com a força da gravidade e empilhadeiras elétricas, sendo que equipamentos movidos a hidrogênio estão em desenvolvimento. Atualmente, a verticalização da estocagem é maior.
Na prática
Desde 2002, a Organização das Nações Unidas (ONU) tem enfatizado o papel relevante da iniciativa privada na aplicação da sustentabilidade para mitigar problemas globais, enfatizou Jorge Soto, diretor de Desenvolvimento Sustentável da Braskem, indústria petroquímica brasileira.
Para ele, as companhias precisam entender quais são os impactos que provocam, realizando estudos em todo o ciclo de vida dos produtos, para depois avançar em contribuições para a minimizá-los ou eliminá-los. A Braskem pesquisou o ciclo de vida de 100 produtos, que em sua produção liberam CO2, mas que, dentro da cadeia, reduzem as emissões. “Por exemplo, um carro que possui componentes de plástico fica menos pesado e emite menos poluentes”, explicou Soto.
A Braskem tem ampliado os investimentos em ações sustentáveis, partindo de um nível de R$ 30 milhões em 2003 para R$ 290 milhões em 2009. As iniciativas foram saindo de um patamar reativo às normas, passando para a busca contínua de maior eficiência nas operações e aderindo, cada vez mais, às estratégias da organização. Um exemplo dessa evolução é o polietileno verde, 100% renovável, desenvolvido a partir do etanol da cana-de-açúcar, cuja produção sequestra CO2.
O Walmart, também representado no workshop, assumiu compromisso com a sustentabilidade na cadeia de suprimentos de ponta a ponta. Recentemente, conforme Yuri Feres, gerente de Sustentabilidade, a rede elegeu produtos líderes de seus nove principais fornecedores para desenvolver em parceria melhorias de desempenho e garantir benefícios à sociedade e ao meio ambiente.
O amaciante Comfort da Unilever, por exemplo, ganhou uma fórmula concentrada e a embalagem passou dos tradicionais 2 litros para 500 mililitros. “É um produto de tamanho menor, com mesmo desempenho e preço mais baixo. Houve uma economia de 60% de materiais, 40% de água e de 40% de gastos com transporte”, indicou Feres.
Além disso, o fornecedor do sabão em pedra da marca própria Walmart criou um produto à base de óleo de cozinha. Os supermercados recebem o óleo para reciclagem e o sabão é produzido com custo 20% menor, vantagem que é repassada aos consumidores.
Mais exemplos
Os Correios demonstraram a preocupação com a sustentabilidade em diversas esferas de sua atuação. Na área de transportes, identificada como um dos pontos geradores de maior impacto, foram adotadas uma série de medidas, contou João Batista Silva, gerente de Vendas Corporativas. São 19 mil caminhões que entregam 34 mil correspondências e 740 mil encomendas por dia pelo modal rodoviário. Os pneus e o óleo dos motores são reciclados e os veículos passam por inspeções constantes para checar os limites de emissão de CO2.
Os uniformes usados pelos mais de 50 mil carteiros são doados para entidades que aproveitam os tecidos na confecção de novas roupas destinadas a crianças carentes. Além disso, as embalagens plásticas e de papel são encaminhadas para triagem e recicladas, garantindo oportunidades de trabalho. Os Correios têm ainda disponibilizado a solução de logística reversa para empresas que buscam minimizar impactos ambientais, otimizando a entrega e a retirada de mercadorias.
A condução de novas formas de desenvolvimento sustentável na Amazônia foi o destaque da apresentação da Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi), entidade sem fins lucrativos que atua na região através da prestação de serviços tecnológicos e educacionais. Um dos trabalhos da Fucapi está relacionado ao chamado design tropical, que visa recuperar e agregar a cultura nativa a produtos feitos com resíduos florestais.
“A ideia é promover a preservação do meio ambiente e garantir maior valor agregado a produtos artesanais, uma alternativa bastante viável”, afirmou Flavio de Barros e Azevedo Ramos, que atua na área de cooperação institucional da entidade. Dentre os produtos inovadores criados por eles, estão móveis feitos com pedaços de madeira de tucumã. Depois de certo volume de produção da fruta explorada comercialmente, a árvore morre e a madeira, com aplicação de tecnologia, pode ser aproveitada.
Logística reversa
A logística reversa, considerada por muitos o final da cadeia produtiva, também foi debatida no workshop. Empresas como Whirpool, Dell e Fiat apresentaram durante o encontro algumas de suas iniciativas para destinação de resíduos sólidos gerados pela fabricação de produtos, e indicaram dificuldades para implementar essas ações.
A Whirpool, do segmento de eletrodomésticos, atua junto ao governo e outras instituições em discussões sobre o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), ainda em fase de implantação, que estabelece diretrizes para a logística reversa de produtos. Paralelamente, instituiu programas de reciclagem de embalagens que envolvem stakeholders como revendedores, fornecedores e Organizações Não Governamentais, informou Vanderlei Niehues, diretor de Sustentabilidade da Whirpool Latin America.
“A sistematização da logística reversa e a responsabilidade compartilhada, que diz respeito a envolver o consumidor nos processos, são os maiores desafios. Além disso, há o aspecto da eficiência da legislação sobre o tema, já que está sendo discutida sem a participação efetiva da sociedade, e a necessidade de criação de mais centros de reciclagem no País”, apontou Niehues.
Na Dell, empresa do segmento de computadores e notebooks, a maior parte das peças de equipamentos vendidos, ainda em garantia e que retornam à fábrica por defeito, é recondicionada dentro de um padrão de qualidade, explicou Marc Stanton, senior logistic manager da empresa. O executivo comentou as barreiras encontradas no processo de reciclagem desses produtos.
“O maior desafio é logístico. O primeiro ponto está em como recolher todos os produtos e levá-los até sua destinação final. O segundo é que alguns tipos de reciclagem só são possíveis em determinados centros, que realizam o processo de forma completa (alguns deles inclusive fora do País). Por último, é preciso promover uma mudança de cultura do consumidor de forma a convencê-lo a se desfazer do produto, entendendo os benefícios da ação dos pontos de vista econômico, social e do meio ambiente”, destacou o Stanton.
Já a Fiat atua seguindo diretivas da Europa, onde a companhia se tornou referência em procedimentos de logística reversa no ramo automobilístico, afirmou o Toshizaemom Noce, coordenador de Inovação e Engenharia de Produção. Ele explicou que, entre as soluções ambientais definidas pela matriz a serem seguidas aqui, estão a redução de emissões de CO² e a meta de reciclar 85%, de cada novo veículo produzido, com o desuso de materiais considerados nocivos (mercúrio, chumbo, cádmio), a reutilização de componentes e a “recuperação energética”, que ocorre por meio da incineração planejada de materiais inutilizáveis e do aproveitamento da energia gerada no processo.
“A Fiat tem buscado atender não só os aspectos ecológicos, como também a satisfação dos clientes”, concluiu Noce.
Fonte: Amcham/São Paulo