Da Redação
Brasília – O entusiasmo manifestado pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, em relação ao plano apresentado pelo Japão para lançar uma aliança estratégica com os Estados Unidos visando a defesa de valores comuns na Ásia e na América Latina, poderá, se levado adiante, receber uma dura resposta do governo de Pequim, além de trazer graves problemas para as relações comerciais entre o Brasil e a China. A iniciativa é vista como mais um gesto anti-China do governo de Jair Bolsonaro,
A notícia dando conta desse plano trilateral foi publicada na última sexta-feira (6) pela Folha de São Paulo, destacando que o chanceler pretende lançar a ideia nos próximos meses. Sua simples menção foi recebida nos meios diplomáticos e empresariais como mais uma grave provocação dirigida aos chineses justamente no momento em que o país asiático vem ampliando consideravelmente as importações de produtos brasileiros, consolidando-se ainda mais como o maior parceiro comercial do país.
A iniciativa de Ernesto Araújo, considerada “estapafúrdia” e “irresponsável” e “terraplanista” por empresários que mantém negócios com a China, vem somar-se ao rico acervo de declarações inoportunas, preconceituosas e xenófobas prestadas por integrantes do governo Bolsonaro em relação à China.
Segundo o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, “às vezes as declarações são feitas num dado momento para parecer que tem o controle de uma situação, outras vezes são feitas para demonstrar poder e outras vezes são declarações que não têm conteúdo, não têm até sustentação para que possam ser cobradas posteriormente”.
Na opinião do presidente da AEB e de empresários que preferem se manter no anonimato, o estrago causado por essas declarações e iniciativas só não é maior porque não existem fornecedores alternativos para produtos como soja, minério de ferro e outros produtos relevantes na pauta exportadora brasileira para a China.
Um desses empresários destacou que isso não significa que a China assistirá passivamente essa sucessão de acontecimentos que podem trazer sérios entraves futuros às relações bilaterais.
Na visão de um outro empresário do agronegócio, é importante acompanhar a maneira como a China vem tratando a Austrália, país que, a exemplo do Brasil, também é um grande exportador de carnes e minério de ferro para os chineses e que vem enfrentando retaliações por cobrar da China explicações sobre a demora na comunicação do surgimento do novo coronavírus no país asiático e por atos considerados racistas contra cidadãos chineses na Austrália.
Semana passada, Ministério da Cultura e Turismo da China exortou os cidadãos chineses a evitar férias na Austrália. O ministério alegou que houve um “aumento significativo” na discriminação e violência racial contra chineses e asiáticos durante a pandemia de coronavírus.
Em 2019, as centenas de milhares de turistas chineses que visitaram a Austrália, realizaram gastos da ordem de US$ 12,3 bilhões, quase um terço dos gastos totais de viajantes internacionais no país durante o período.
Mas as perdas no setor de turismo podem ser apenas uma ponta do iceberg que vem sendo preparado pela China em retaliação à Austrália. No mês passado, a China, maior parceiro comercial da Austrália, e também do Brasil, anunciou a aplicação de tarifas de 80,5% sobre as exportações australianas de cevada e suspendeu as importações de carne bovina de quatro dos maiores fornecedores australianos. Caso a Austrália insista em cobrar de Pequim explicações sobre o surgimento do novo coronavírus, outras medidas retaliatórias poderão ser usadas pelo país asiático contra os australianos.